Reagindo a Oceano

Existe um tipo de vídeo nas redes sociais que registra o momento em que pessoas ouvem uma determinada música ou vídeo pela primeira vez e mostra sua reação. Eu gosto muito de ver gringos reagindo a músicas brasileiras porque no Brasil temos um estilo muito especial e único, independente do gênero, que combina muitas características, desde a cadência de nossa fala até nossa criatividade rítmica.

Hoje vi um desses "reacts" de uma profissional técnica de canto estadunidense ouvindo pela primeira vez a Oceano, de Djavan, em um show ao vivo, onde a plateia naturalmente - para nós - interage e canta junto alguns trechos desse clássico nacional lindamente executado à voz e violão apenas. Mesmo sem entender o idioma, próximo ao final ela estava totalmente emocionada, ao ponto de embargar a voz enquanto tentava fazer pequenos comentários técnicos sobre o que ouvia e sentia. 

Enquanto assistia (e também me emocionava), me coloquei no lugar dela por um instante e pensei:
"imagina como deve ser ouvir a Djavan pela primeira vez!"

Essa percepção me fez refletir sobre o quanto nós, meros humanos consumistas, não valorizamos o que já temos. E digo consumistas porque tem relação com isso mesmo, um produto. Nunca estamos satisfeitos com o que temos, somos estimulados a sempre querer mais, o mais novo, o mais moderno, a novidade e nessa busca desenfreada pelo que não temos, deixamos de apreciar o que temos e que muitas vezes custou muito para ter, seja dinheiro, tempo ou paz.

O fato é que cada vez menos nos importamos em apreciar algo, seja uma música bonita, uma boa refeição, um belo dia de sol ou até mesmo a companhia de alguém. Nos tem sido colocado há muito tempo um modelo de vida que nos dita o padrão de vida que "queremos" ter e que para alcançá-lo, é necessário um investimento total de vida, mas que sem percebemos, toda vez que se aproxima, muda e fica mais longe. Assim, passamos toda nossa vida buscando algo que ainda não temos e não desfrutamos do que já alcançamos.

Um exemplo simples é o smartphone. Você pode ter um modelo muito recente, com muitos recursos como uma ótima câmera e alta velocidade de navegação na Internet. Você se esforçou muito para conseguir comprar esse modelo mas assim que o adquiriu, percebeu que existe um modelo mais recente, com mais resolução de imagem. Isso causa um certo sentimento de frustração que "tira o brilho" daquele aparelho que te custou tanto para conseguir. É isso o que o consumismo faz, ele te torna um eterno insatisfeito.

Zygmunt Bauman, um famoso psicólogo e sociólogo polonês descreveu em sua obra Modernidade Líquida (em 1999) que as relações do homem para com o outro, com o trabalho e com as coisas está cada vez mais frágil e que o consumismo e o capitalismo se tornaram uma definição do indivíduo, um tipo de identidade, o que o torna cada vez mas isolado socialmente. Tudo isso foi escrito antes das redes sociais, o que torna essa afirmação ainda mais grave quando olhamos para o hoje.

Em contrapartida, quando olhamos para a bíblia, olha o que Jesus diz aos seus discípulos sobre as preocupações da vida:

"Não ajuntem tesouros aqui na terra, onde as traças e a ferrugem os destroem, e onde ladrões arrombam casas e os furtam. Ajuntem seus tesouros no céu, onde traças e ferrugem não destroem, e onde ladrões não arrombam nem furtam. Onde seu tesouro estiver, ali também estará seu coração
Seus olhos são como uma lâmpada que ilumina todo o corpo. Quando os olhos são bons, todo o corpo se enche de luz, mas, quando os olhos são maus, o corpo se enche de escuridão. E, se a luz que há em vocês é, na verdade, escuridão, como é profunda essa escuridão! 
Ninguém pode servir a dois senhores, pois odiará um e amará o outro; será dedicado a um e desprezará o outro. Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro."  (Mateus 6:19-24)

Na continuação deste trecho, Jesus usa exemplos contempláveis da natureza como a beleza dos campos de trigo e do alimento dos pássaros que não o recebem por pagamento, para ilustrar aos ouvintes que a vida não é o que temos, mas o que acontece ao nosso redor enquanto estamos aqui buscando ter.

Parar um pouco para ouvir o que uma música diz, sentar para tomar um bom café e sentir seu sabor ou deixar de usar o celular enquanto alguém fala conosco são pequenos passos para nos lembrar que estamos vivos e assim ir percebendo que talvez já tenhamos tudo o que precisamos. Não vamos conseguir alcançar um estado de satisfação se não mudarmos nosso estilo de vida consumista. Precisamos apreciar e aproveitar o que já temos, sejam coisas, sejam pessoas ou momentos.

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